Fotos Anamaria Rossi
Se me contassem (e eu fosse uma cozinheira incrédula) eu diria que era piada. Pão de queijo sem ovos??? Mas foi Dona Lígia quem contou, e ela tem uma longa estrada de forno & fogão – lá nas Minas Gerais e aqui mesmo, no Planalto, a porção asfaltada do nosso Grande Sertão.
Dona Lígia Rosa do Rosário é mãe das queridas Ana Maria Costa e Cristina Roberto, e avó da talentosa Ligiana. Mas, antes de qualquer coisa, Dona Lígia é mineira, poeta, quituteira e biscoiteira de mão cheíssima. Pelo menos é o que me contam. Com fartura de testemunhas.
Da poesia fui eu mesma testemunha, numa tarde chuvosa no raiar de 2012, lá na Aldeia do Urubu. Dona Lígia sentadinha na varanda e toda a gente reunida para ouvi-la declamar – como quem não declama, mas conta um causo, cheio de altos e baixos e idas e vindas – um poema de 58 versos, sem cola e sem tropeços, os olhinhos vibrando como uma Sherazade encantadora. “Renúncia”. Que Dona Lígia assinou como Carmem, em 1935, e que tem trechos como este:
E quando passar em minha casa que aí fica
onde nasceram e morreram nossas ilusões
brincando com aquele estoir rendado
que você se recostava…
Peça ao vento que me traga pelo espaço
aquele perfume que sentia no terraço
Para enfeitar a nossa então felicidade.
Semana passada Dona Lígia fez 94 anos. Não pude ir à festa, mas ganhei da minha amiga, médica e xará Ana Maria Costa o melhor dos presentes: um caderninho com receitas e poemas de Dona Lígia. Foi de lá que tirei a idéia (maluca) do pão de queijo sem ovos.
E como, ao fim e ao cabo, sou mais crédula do que eu mesma posso crer, não só resolvi experimentar como me atrevi a mudar a receita. Na verdade, adaptar aos ingredientes que eu tinha disponíveis.
Para ser honesta com meus 25 leitores e justa com a homenageada, aí vão as duas receitas. A original, legítima e verdadeira receita do pão de queijo sem ovos da Dona Lígia Rosa do Rosário… e o meu arremedo experimental e improvisativo de um sábado de manhã sem quase nada na geladeira.
Pão de queijo de Dona Lígia
- 1 prato de polvilho doce bem cheio
- 1 prato de óleo pela marca do prato antes da borda
- 1 prato de queijo ralado
- 1 prato de leite bem cheio
Modo de fazer
- Escaldar o polvilho mexendo bem.
- A qualidade do polvilho tem grande importância. Recomenda-se os mais rústicos de grãos maiores.
- Colocar o prato de queijo ralado (quanto menos queijo, mais os pães crescem).
- Amassar com leite ou coalhada.
- Fazer as bolinhas e colocar no forno quente. A massa pode ser congelada por vários dias.
Ela ensina ainda:
São muitas as receitas de pão de queijo. Pode-se pegar, por exemplo, 4 copos de polvilho e escaldar com um copo de óleo e um copo de leite ou de água. Mexer bem. Colocar sal a gosto. Misturar um prato de sobremesa de queijo. Pode-se acrescentar ovos à massa e algumas pessoas usam coalhada em vez de leite. Neste caso, não se ferve a coalhada com o óleo.
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E aqui a minha modesta adaptação:
Pão de queijo sem ovos de Donana
- 1 xícara de polvilho azedo
- 1 xícara de polvilho doce
- 1 xícara de óleo de girassol
- 1 xícara de leite
- 1/2 xícara de queijo cottage (ou coalhada sem soro)
- 1 xícara de queijo curado ralado fino
- 1/2 xícara de queijo curado ralado grosso
- 1 colher (sobremesa) de sal
Modo de fazer
- Misturar os dois polvilhos e o sal e escaldar com 1 xícara de óleo e 1/2 xícara de leite ferventes.
- Deixar amornar um pouco, juntar o queijo ralado e misturar bem.
- Diluir o queijo cottage em 1/2 xícara de leite frio e ir juntando aos poucos à massa, misturando com as mãos.
- Amassar até dar ponto, juntando mais leite frio ou mais polvilho (sempre em partes iguais de azedo e doce), conforme o necessário para obter a textura desejada.
- Fazer bolinhas e levar ao forno quente por 20 a 25 minutos, ou até ficar douradinho.
Agora eu me explico.
O polvilho azedo entrou na mistura para dar a rusticidade necessária à massa, e maior capacidade de “explosão” em alta temperatura, já que a receita não leva ovos (as claras são responsáveis em boa parte pela “explosão” da massa) e o polvilho doce industrializado é fino e delicado como um talco e está a léguas de distância do potencial do polvilho da fazenda.
O queijo cottage entrou por dois motivos: porque eu tinha meio potinho vencendo na geladeira e porque ele tem uma acidez bem próxima à da coalhada, o que me fez pensar nele imediatamente ao ler a receita de Dona Lígia. Apenas cuidei de hidratá-lo um pouco no leite, mas sem perder o granulado, que também ajuda a deixar a massa mais rústica.
Mantive, ao final, a técnica e as proporções entre secos e molhados da receita de Dona Lígia. E acho que ela não ficaria decepcionada com o resultado. Mas só tem um jeito de saber: levando meu PDQ para ela experimentar. Quem sabe?
Uma graça Anamaria. Amei!
Esqueci de dizer. Eu que montei o fanzine. Bjo!
Obrigada, Simone.
Ainda tem um fanzine?
Bj.
Parabéns pelo seu blog, é simplesmente cativante!
Por problemas de saúde, faz tempo que venho pesquisando e desenvolvendo receitas “light”. Com triglicérides supitando, geralmente eu substituo os ovos das receitas por iogurte natural, na proporção de 1 copinho de iogurte para cada 3 ovos. Faço pão de queijo com 2 xícaras (chá) de polvilho, 1 copinho de iogurte natural, 1 copinho de ricota amassada, 2 colheres (sobremesa) de margarina light, 1 colher (sopa) de fermento em pó e 2 xícaras de queijo ralado, se necessário, um pouquinho de leite para dar o ponto de enrolar. Tenho um primo que mora no Panamá, onde não tem polvilho e desenvolvi uma receita sem polvilho, só pra ele matar um pouquinho da vontade. Está no meu blog.
Obrigada pela visita, Maria José!
Fui ao seu blog e achei bem interessante a receita, mas não consegui comentar lá. Qualquer hora vou testar seu PDQ sem polvilho.
Abraço,
Ana.